segunda-feira, 29 de junho de 2009

aquilo que não se explica

Tua serenidade e teu encanto atravessaram meus olhos
E te desenhei em pensamentos de orvalho e luz.
Da tua voz que nunca ouvi, mas que não se cala,
Fiz um o canto perfeito e nítido como a manhã.

Tua suavidade não se explica e não se explica teu cheiro,
Mas cabem bem na minha imaginação com tua boca e pele.
E enquanto me tens sem reservas, transparente e nua.
Eu te guardo em meus espaços que decoram tua passagem.

Na rendição confortante que me invadiu sutilmente
Repousei minhas resistências antes que amanhecesse,
E uma fantasia absurda que ignora lógica e distância
Instalou-se em minhas pálpebras com o toque de teus lábios.

Tua lembrança susteve no meu rosto um riso bobo e essa paz,
Que agora resplandece com acordes em tons de Sol.

domingo, 31 de maio de 2009

do que é incompleto

Numa parte que me falta
ficou uma dor assim desajeitada,
metade de um riso escondido
que se misturam a um alívio estranho.

O tempo que tínhamos nas mãos
de repente se fez nuvem
e se desfez lentamente,
como o silêncio macio da tua risada.

Então escondi o rosto ente meus dedos
e com o olhar pálido e meditativo
segui o brilho em prata e ouro
dos teus passos em liberdade.

E contemplei teus rastros feitos de resto de orvalho
se confundirem com os primeiros traços da manhã.

domingo, 17 de maio de 2009

calmaria






Talvez eu tentasse falar
mas o silêncio ganhou minha língua e voz
e me desfez mansamente,
a mim, que desconheço o que é manso.

Num breve momento de desvelo e perfume,
as minhas pálpebras serenaram.
O que era efêmero se transfez:
e susteve o tempo, feito um acorde.

Mas um pedaço de mim se desprendeu
com a leveza da tua voz descansada.
Ficou a sensação que nem se descreve
do riso fácil que não se mostra,

da paz, em minhas mãos aquecidas,
do gosto das palavras caladas.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Urgência

uma hora o amor aparece,
e consome essa urgência
que me transborda pelos poros.

até lá,
solidão a me contar piadas
fica debruçada no espelho,
olhar quase cínico
por trás da ferrugem.
riso de deboche e compaixão obscena,
como quem relembra um gozo.

corto a madrugada
com os cacos do espelho.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Tóxico

se vais ou ficas
já nem me interessa.

ficam
meus olhos presos em tua boca
enquanto caminho em teus cabelos.

e se devoro
tua saliva e teus venenos
convertidos em verbos

é só um modo doentio
de sarar minha carne corrompida
e te pertencer um pouco mais

enquanto adulteras minha corrente sanguínea
invadindo-me gota a gota,
amargamente.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Brilho Insone

menina de olhos abertos
de insônia em insônia
nas madrugadas

entre acordes de violão e vinis de Chico
e drummonds avulsos
que coisa
não dorme

notívaga
derrama o fim do escuro
em mais uma xícara de café

e que à noite brilhem sempre
como estrelas,
olhos sem receita de Ester.

Cris e Calaça

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Função Poética

A mim já não satisfaz
a arte perfeita, pesada e medida.

Prefiro minha loucura dolorida e sincera
aos valorosos moldes vazios.
Meus substantivos desadjetivados
não cabem nas suas leituras.

Deixo para o papel algumas
overdoses que não tive,

e que meu sentimentalismo barato
sirva-me pelo menos para rascunhar
alguns orgasmos, ainda que medianos
metrificados em fingimentos poéticos.

Pequeno poema de amor

Meus lábios
pequenos
se alegram
com tua língua
ágil e precisa
me provocando
arrepios
e acelerando minha respiração.

Preparas a boca
que te come.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Algemas

pés e mãos
atadas
nada a fazer
só a sentir.

palidez

Ando pálida
sangrando palavras antigas entre silêncios errados
nas noites em que atravesso
fingindo dormir.

Minha incoerência
é manter-me desperta
é forjar expressão
quando todos os meus sentidos
já me deixaram.
Nua.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Confessional

As paredes vazias e silenciosas já não me fazem companhia.

Solitariamente,
absurda e intrépida,
busco a palavra certa,
que se esconde entre minhas desorganizações.

O quarto sufoca minha insônia
e o calor é a minha insanidade.

E se hoje não durmo só,
é porque não durmo.

Só.

sábado, 31 de janeiro de 2009

Sobre minha solidão

Os finais de semana marcados por minhas pernas estendidas estrategicamente sobre o braço do sofá, enquanto a TV fala sozinha, tem me dado uma outra dimensão de filosofia.
Há tempos estar sozinha não me parece tão agradável. Na verdade, desde a minha conturbada adolescência, quando saboreava crises depressivas, solidão não me apetece tanto. Claro que da minha solidão de quase 15 para meu estado de solidão caminhando para os 30, há uma infinita distância. Já não me tranco no quarto, deitada no chão, enquanto me embebedo de Led Zeppelin divagando sobre alguma escadaria para o céu. Nem passo horas rabiscando meus planos para a vida adulta, pois – quem diria?- aqui estou eu. Minha solidão hoje é tão mais sóbria, tranquila e um tanto quanto suave até em minhas doses de nostalgia. Olhando para a TV sem compreender bem o que se passa lá dentro, vou refazendo mentalmente a trilha conhecida dos colegas de escola: Esse: casado; aquele: casado; aquela: divorciada, casada pela segunda vez; essa: feliz, casada, três filhas; esse: (opa, esse era aquele com quem eu iria me casar para ser feliz para sempre) casado – e não é comigo... Notícias de casamentos, descasamentos e partos agora me pegam sozinha, sempre seguida da pergunta que já não me parece nada embaraçosa “e você, quando casa?” Nem ao menos sinto qualquer necessidade de explicar sobre os caminhos tortuosos que a vida me fez passar até aqui. Talvez alguns eventos sobre mim soassem muito contraditórios com esse quase sorriso na minha expressão descansada, e nem eu poderia explicar. E no meio dessas minhas recordações, hipóteses e situações que ainda invento, perco-me lentamente em comerciais de produtos que provavelmente nunca usarei. O cansaço da semana parece pesar e já sinto uma região adormecida nas pernas, o que nada me incomoda. Tento restabelecer o contato com a realidade, e em um movimento um pouco mais brusco com a cabeça, expulso meus demônios envelhecidos para gozar mais do meu estado contemplativo da solidão. Rio de mim mesma ao consultar o relógio. Embora não tenha nenhum compromisso sinto-me atrasada. E como se estivesse analisando cada movimento meu, levanto-me, apago a TV e a escuridão e o silêncio me penetram. Ultimamente meus fantasmas andam me ditando até os meus horários. Com o olhar vago que nem chega a denunciar nenhum estado interior, recolho-me a mim e adormeço outra vez sozinha, depois de mais uma xícara de café.

Pequeno ensaio sobre o esquecimento


Eu hoje resolvi me esvaziar de seus restos. Respirei fundo algumas vezes até me convencer dessa necessidade absurda. Não foi uma nem duas vezes, foram várias inspirações e expirações. Para esvaziar-se é preciso antes se encher. Caminhei até mim mesma, dei várias voltas em meus silêncios e constatei. Seu tempo em mim acabou. Achei estranho não ter lágrimas a oferecer-lhe, nem poemas melancólicos como de costume. Não é de meu feitio sair assim, como quem nunca entrou. No entanto quando senti todas minhas vestes ultrapassadas, toda a maquiagem ridícula, veio-me uma vontade tão grande de gargalhar que preferi me calar. Se eu pudesse prever como seria uma despedida, se eu conseguisse decifrar seus sinais, talvez tivesse palavras exatas e contundentes para lhe deixar como recordação. Mas elas teriam que ser palavras novas, talvez inventadas. Palavras que mexessem com sua porção mais íntima do cérebro a fim de conferir-lhes algum sentido. Mas não encontrei nenhuma que fosse síntese desses anos, por isso repousei o fone no gancho antes que a ligação se concluísse. Saio como quem nunca entrou, de fato, acreditando ser esse o segredo de algum amor próprio, de uma faísca de dignidade a alguém que se retira silenciosamente antes de ser percebido. Os seus rastros na casa, seu cheiro insistente nos meus cabelos, e até sua risada enigmática, precisei atirar tudo ao fogo. Desinfetar-me parece um processo doloroso e talvez me custe algum tempo. Mas hoje decidi que sua voz já não tem efeito sobre mim e que seu silêncio é só silêncio. E na verdade, olhando-o assim de fora, com olhar de quem já recupera algum sentido, você me parece uma figura indefinida de um volume de enciclopédia e eu procuro qualquer legenda que me ajude a compreendê-lo como de fato jamais compreendi. Desprendi-me da urgência de escrevê-lo e nem busco mais suas referências bibliográficas gastas e forjadas. E, agora, no fim desse meu ressurgimento nem posso mais denominar com certeza sua imagem. Assusto-me. Saio pé ante pé da área minúscula do seu domínio, que me parece tão estranha que chega a me sufocar, fecho a porta silenciosamente e ganho uma outra dimensão. O ar que faltava nos pulmões há muito tempo arde em meu interior. Respirar é uma antiga novidade que agora apreendo. Expiro tudo o que pode ainda ser de você e num sorriso largo decreto-lhe, enfim, um ponto final. De volta ao meu próprio tempo, recomeço por outra trilha. Até as nuvens carregadas com seus trovões soam mais suaves quando não se tem mais medo de chuva.

domingo, 25 de janeiro de 2009

do meu silêncio

Meu silêncio é vazio
e não significa nada além de mim.

Se contemplo a trajetória displicente
do voo de uma mosca,
não há nisso qualquer filosofia
nem tentativa desenfreada de transformar,
o que existe e se acaba por si mesmo,
em tipo de metáfora escondida.

Portanto não me incomode
com o que hei de concluir
quando meus olhos piscarem
e qualquer suspiro sozinho
interromper meu estado.

Meu silêncio é apenas silêncio.
Puro e despretensioso.

E o olhar vago e distante não vê na mosca
outra coisa senão mosca.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Desamando

A tarde quente e anuviada
é síntese quase perfeita
do amor interminável por ti.

Sufoca-me
devora-me
intriga-me.

Então
caem do céu algumas gotas geladas
que aliviam-me a febre
da infecção que me causas.

Junto com a tarde morrendo
vejo-me distante
anoitecer
refrescantemente
enquanto tento em vão
recordar teu nome.

E a chaga de tua presença abandona meu corpo desperto e a alma aliviada.

sábado, 3 de janeiro de 2009

Desatino

Vagam por lugar nenhum
meus olhos consumidos por loucura e solidão.

Pousam sobre o branco vazio da parede
e lá ficam,
rascunhando palavras inexistentes
e versos aborrecidos
sobre quem sou
ou quem nunca fui.

Fecho os olhos,
torno a abri-los, em desatino.

De poema fraco e fingido,
volto a ser só pálida imagem
talhada no porta-retrato.
Dói.

Embriago-me de uma doce insanidade
que me engole.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Ano Novo


Amanheço sem ter adormecido.
Nem assim contive o tempo.

Em um segundo
o que era já não é,
e nem sei em que dia meu calendário parou.

É ano novo
e esse gosto de trovão e calor
torna tudo igual.

Ao longe os ruídos que sugerem festa
me chegam patéticos.

Vagarosamente vou me despindo de vestes e maquiagem
e me deito
envelhecidamente,
tentando desembaraçar os sons do ano passado.