segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Inverno

A noite vem fria
chega gelada e fica.
Dentro e fora da alma.

A pele arrepiada
já não é espera
nem esperança.

O lábio castigado
já não é beijo
nem palavra.

Longe, tão longe
o olhar parado
nem ultrapassa o teto.

Mas espalhada
por todos os lados,

em silêncio
morro de frio.

Por inteiro

Sou dessas que se rasgam por ciúmes,
que se matariam por amor.
Encontro-me em pedaços
e retorno inteira.

Capaz de rabiscar muros
calçadas e nuvens,
De gritar frases apaixonadas e desconexas
e berrar insanidades na raiva.

Dessas que se quebram
para depois juntar os cacos,
e nua, indefesa,
buscar abrigo em cetins vermelhos
sem razões
ou poesias.

Libertação

vou sair
beber
dançar
procurar você
por becos infames

e quando encontrar
vou mandar você para o inferno
com a graça de quem valsa para o rei.

Poema de amor

Para fazer poemas de amor
- daqueles que tocam fundo na alma,
daqueles que trazem brilho ao olhar -
não basta ter papel, caneta e um amor...
é necessário ter também uma tristeza...
Assim meio suave, assim meio profunda, um pouquinho de felicidade escondida
ou desejada... uma tristeza inexplicável.

Porque o amor pode até se fazer de alegrias
mas os poemas de amor se constroem no escuro.

Lindo é o sorriso nos lábios, a felicidade no olhar,
o riso espontâneo e tudo mais...
Lindo é perder o fôlego de rir,
e depois ficar em silêncio com um sorriso meio bobo na face...
Lindo é ser feliz.

Mas poemas de amor são palavras
que vêm das lágrimas.
Palavras que se bem degustadas percebe-se seu gosto de sal.
ah, o amor... sim ele é lindo,
deveria então ser alegre, mas não o é.

Seriam todos os poemas de amor assim?
Ou será só a minha alma que só entende de solidão?
Tenho um pouco de felicidade em mim
mas acho que ela está bem longe dos dedos.

Um dia quero não sofrer por amor...
Vou ler poemas de luz e música
e quando ler poemas de amor
sentirei saudades de mim.

Descanso


Suave semblante na pele clara.
Transpiram ternura os traços serenos,
Um quase sorriso em lábios pequenos
Diz em silêncio a vida que sonhara.

Não há mais luz para os olhos fechados,
Prantos vãos já não lhe alcançam o ouvido.
Doce anjo em tênue véu envolvido
Descansa o enfado dos dias podados.

- Dorme menina, entre pálidas flores,
que envolve teu corpo um gélido encanto.
Alheia às lágrimas, alheia às dores.

Entregue ao profundo sono final,
Fica teu corpo em tranqüilo recanto.
Tua alma sobe e se faz imortal.

sábado, 20 de setembro de 2008

Serenidade

Durmo pouco,
sonho menos ainda.
Meus dias vão se perdendo em auroras irremediáveis.
Resignadamente.

Não me admiram nos olhos
estas marcas precoces
de solidão e falta de poesia,

nem me assusta mais
a vertigem dolorida de noites insones.

Sufocada por palavras indizíveis
conforto-me com a cumplicidade dos calmantes
que garantem por um momento mais
o alívio de um longo orgasmo fingido.

Pseudoansiolítico

Vozes na mente. Palavras sem nexo.
Alucinações sem reflexos.
Não sei onde estou.
Sentada. Cansada. Criança. Atormentada.
A TV irrita. Sarcasmo irrita.  Padrões irritam.
Lágrimas. Dor. Aflição.
Onde estou? Não me importa.
Vai para o Inferno!
Com teus olhos piedosos. Para o inferno!
Eles entendem.
Falam. Gritam. Pedem. Ordenam.
Menos um, menos dois, menos menos menos
Choro. Sozinha.  Adolescente. Cansada.

Só menos um... Pede, ordena, ri...
menos três.
Está nas revistas, na TV, e devora meu cérebro.
Dor. Desespero. Fim de tarde e tremor.
Não sei onde estou. Escuridão.
Saio tateando, procurando liberdade.
Autoestima. Confiança. Blá blá blá...Para o inferno!
Com todos os anjos caídos. Arremessados. Atormentados. Enlouquecidos. E ridículos.

Cela triste à qual me atiraram.
Pequena. Úmida. Marcada. Violentada.
Eles cochicham enquanto durmo...
menos um, menos dois, sempre menos mas ouço alucinada.
Hábeas corpus.Tarde demais.
Fim de tarde. Fim do túnel.

Deixa-me.
Guarda tua boca.
Cela triste. Apertada.
Saiam todos. Fiquem eles, só os fantasmas.
Dor. Medo. Boca seca e amarga.
Falam. Gritam. Riem.
Menos menos menos quatro. Sobra nada.
Só o maldito espelho.
Restos cacos pedaços de olhos.
Onde estão meus olhos?

Correntes pesadas.
Choro. Sozinha. Marcada. Adulta. Adulterada. Cansada cansada
Boca  seca, amarga, sangrando, sozinha, desvairada.

Não há volta.
Fraca, iludida, com meus olhos distorcidos
Menos menos menos
Sobra nada. Quase nada. Meus ossos grunhindo de frio.
Choro. Grito. Vejo. Revejo. Choro.
Não é suficiente. Nunca é.
Calada. Adulta. Desesperada.

Água, álcool, espelho e clonazepam.
Grito. Sangro. Cansada.
Gosto ruim. Overdose.
Acordada. Retalhada. Calada. Exausta. Paralisada.
Menos cinco. Ou seis.
Depois... Agora parto.
Durmo só. Calei todas vozes.
Uma dose. Duas doses. Overdose.

Adulta, fracassada, dopada.
Apaguem as luzes e fechem a porta. Obrigada.

Sedada

Não preciso de tuas palavras.
Muitas delas não fazem sentido para mim
Confusa. Perdida. Atormentada.
Muito obrigada. Não quero palavras.
Já tenho muitas na cabeça.
Sem nexo. Sem dono. Embriagadas, como eu.
Que importa?
Me vê mais uma dose de anestésico, ou arsênico. Tanto faz.
Só não quero palavras,
nem as mais elaboradas, recém-criadas, recicladas.
Não quero diagnósticos, prognósticos, teu eufemismo barato.
Nem atenção.
Guarda o sorriso sarcástico.
Engole tua premiada sensatez.
E deixa- me aqui que não ouço nada.
Não acendas a luz. Apaga tua piedade.
Não preciso de nada.
Guarda essa compaixão para os mendigos que vêm à tua porta.
Tuas palavras, tuas mãos.
Não, muito obrigada.
Economiza o velho espelho que para mim não vale nada e velhas moedas de lata.
Fico aqui. Confusa. Perdida. Minguada.
Não te inquietes por minha alma.
Muito obrigada. Se serve de consolo não restou mais nada.
Apaga a luz, fecha a porta. Deixa- me aqui no meio do caminho. Com pedras.
Não vou, nem venho. Fico. Vai embora.
Antes me vê mais uma dose. Ou overdose. Mais nada.
Ah, tira daqui todas as palavras e aquela caixinha de boas intenções.
Não esqueças: apaga a luz, fecha a porta.
Shhhhh Sem barulho, que para mim basta.
Confusa. Perdida. Sedada.
E se isso faz sentires melhor, estou inteira, muito obrigada.

Palavra

Sigo em busca de um verso inicial,
Que ele possa conter a minha dor,
E todo esse medo devastador.
Verso que abrigue a lágrima final.

E que a palavra alivie meu mal,
Arrancando o silêncio abrasador.
Possa esse meu grito ensurdecedor
Libertar a minha alma tão mortal.

E se essa angústia não tem uma cura,
Enquanto esse ácido interior
Arrasta-me a essa intensa loucura,

Senhor, deixa-me mergulhar no nada,
Fecha enfim meus olhos por essa dor,
E, como remédio, eu morra calada.

Agonia

Não quero cantar a dor que me aquece
nem a lágrima fria,
não quero cantar nenhuma esperança vadia,
nem este olhar que escurece.

Não há canção para a noite ou para o dia,
para o semblante que envelhece.
E para o hoje que morreu sem nenhuma prece
não haverá canção, nem letra ou melodia.

Não falarei do peso que o medo oferece,
que me esmaga com delicada grosseria.
Para tudo que dentro de mim havia
fecho minha boca, tapo os ouvidos e a visão não reconhece.

Fecho a janela para este mundo que é fantasia
e não canto para o que era e apodrece.

Um minuto de silêncio, que minha morte merece,
só silêncio...
Nem canção,
nem discurso,
talvez um suspiro longo, infinito...
e um cálice cheio de uma vida vazia.

Outra


Essa que vejo no espelho
de triste semblante refletido,
será um resto de tempo esquecido
ou só relâmpago de olhar vermelho?

Essa que nem se pode distinguir
fica ali inexpressiva, paralisada,
em cada detalhe, busco em vão, assustada
um traço ou outro que me possa definir.

Onde, minha serenidade?
Onde, minha juventude?
Vejo no espelho o tudo que jamais pude
e a frustração de ser só metade.

Pobre imagem, no espelho, esculpida
serei eu, será ela... a realidade inexiste.
Porcelana pálida, fiel retrato triste,
sou ninguém... alheia a mim, alheia à vida.

Análise

Sento-me diante de mim
cheia de razão e convicções.
No meu olhar o sol vai se pondo.

Procuro adormecer
lucidamente solitária.

Ainda ouço barulhos lá fora
confusos, sinestésicos.

A noite que chega
é a carícia vazia, quase irreal.
Multiplicando-se pelas esquinas
sinto o cheiro da embriaguez mundana,
que invejo tanto...