terça-feira, 18 de julho de 2017

Se alguém ainda passar por aqui e ler...

Quem está lendo sabe que sou eu que escrevi, afinal, tem meu nome, tem uma foto  (só dois pés, mas é uma foto) e com um clique dá pra descobrir bastante coisa sobre mim. Privacidade na era virtual pra quê?
Mas às vezes tenho vontade de espalhar pela cidade folhas anônimas   datilografadas contando que tem hora que a ansiedade e o desespero chegam tão forte, como ontem, que a única coisa que posso fazer é encontrar algo que me rasgue a pele, que me tire sangue, que faça latejar num corte no pulso essa bola que tenho na garganta  e que me impede de gritar.
Eu escreveria sobre o imenso vazio de não pertencer a lugar nenhum, de não se enxergar em reflexo nenhum, de não saber se definir - como definir-se se a cada instante há uma reconfiguração de personalidade? Do ódio ao amor em questão de minutos, embaralhando o cérebro das pessoas que mais amamos, aquelas poucas corajosas que encaram entrar nessa montanha russa.
Muitas pessoas que encontrassem um papel assim na rua e por curiosidade  (e paciência) lessem até o final, poderiam achar piada, frescura ou chilique alguém dizer que chega a ser uma dor física,  uma angústia insuportável a possibilidade de qualquer tipo de rejeição e  abandono, até aquele abandono que só a gente fantasia. Diriam que é pra chamar a atenção quando não aguentamos mais nossos fantasmas e só queremos morrer.
Mas danem-se.
Ainda há tantas pessoas sofrendo achando que não são normais, sendo julgadas por não conseguirem parar em um emprego, rotuladas de neuróticas (ok, somos)...
Seria mais fácil sair pichando muros escrevendo "Respira fundo. Você vai sobreviver." Mas isso não bastaria pra dizer que estou lutando também. E nem a muralha da China daria conta do que sentimos.
Eu me contentaria em espalhar textos aleatoriamente por aí. Se apenas uma pessoa passar,  ler, entender um centésimo do que sentimos ou descobrir que o que sente não faz dela uma louca, mesmo que a vontade de morrer pareça maior que tudo  (parece, mas nunca é) vai ter valido a pena dizer pra respirar fundo e sobreviver.



segunda-feira, 20 de março de 2017

Vertigem
.
Meu eu-lírico sou eu mesma, rota dadaísta 
vertiginosa, 
E explodo a uma velocidade surreal e sibilante
Na traseira de um caminhão. 
.
Meus pedaços vão subindo subindo subindo 
Até atingirem o pico do inferno 
E sem paraquedas  desabam no chão numa massa gelatinosa. 
Disforme. 
.
Sou um eu-lírico estropiado, restos inertes
Segundo a Santa Madre Igreja 
Sem salvação. 
.
Meu eu-lírico não tem nada de lírico 
Nada de poesia
Nada de seguro.
.
Deixo ao mundo 37 parcelas pra pagar
Enquanto pago minha eternidade na danação.
.
.
Bloody Mary
.
Vazio que se faz assim fora de hora
é soco na boca do estômago
é amargo
.
é um silêncio imposto
poesia de rima gasta
que fica engasgada
pela poeira de um boteco antigo.
.
de repente o tempo fechou.
a casa caiu.
boteco esvaziou
alguém partiu. sem riso. sem vela.
-- Sem choro, seus filhos da puta!
.
solitário em cima do balcão,
como se olhasse perguntando algo
um copo de Bloody Mary pela metade.
A morte não tem graça.
.
.
.
.
Para Véio China, 20/ 03/ 2015

domingo, 18 de dezembro de 2016

Bem ou mal a gente sempre se acostuma
às ausências doloridas
aos novos sabores
às novas rotinas
e aos silêncios,  ah, os silêncios...

E a gente se acostuma aos remédios amargos
àquela dor que medicina não tira
à procura de novos planos
que a gente nem sabe por onde começar.
Mas a gente começa.

Bem ou mal, o nó na garganta desata
o rio que me embaçava a vista, seca
e novas sementes vão sendo plantadas.
E bem ou bem a gente vive
porque mal já não dá mais.

sexta-feira, 18 de novembro de 2016

in the border


há uma linha tênue
entre o que sou e a sanidade
vermelha-cor-de-dentro
corpo ardendo ardendo
poros pedindo silêncio.
mundo inteiro em desacerto
se equilibrando in the line.


o rosto suando
é pouco é nada é dose
overdose overandover
cada vez mais à flor da pele
rompida, que impele a implosão

vejo na pele marcada
o limite traçado, por mim demarcado
arde-me os olhos, acalma-me alma

na pele rasgada
vermelho-combustão

há um silêncio pesado e assassino 
so hard soul border.
em segundos,
milhares de mim aos ares 
milhares de mim ao chão.

(em) bananada


madrugada
quente/fria
na parede estrelada.
adoçando a boca
nua e sem peso
trago, perdida, a alma
embananada.

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Poeminha final




gente nova não deveria morrer
de nenhuma morte.
ainda mais tão nova
ainda mais tão gente.
com a morte na velhice, a alma se consola
quase que silenciosamente
como se aceitasse uma lei
que o coração já prevê.
mas com gente nova, não.
gente que mal começou a ver e ouvir a vida
e que nem conheceu todos os passos
de todas as danças
não deveria dar de cara com o fim
deveria ficar mais e passar por tudo que é da vida
obrigatoriamente.
e embriagar-se de loucuras secretas
e gozar de flores e estrelas no meio da madrugada.
gente nova deveria viver
em vez de ir descansar em paz.