Mas às vezes tenho vontade de espalhar pela cidade folhas anônimas datilografadas contando que tem hora que a ansiedade e o desespero chegam tão forte, como ontem, que a única coisa que posso fazer é encontrar algo que me rasgue a pele, que me tire sangue, que faça latejar num corte no pulso essa bola que tenho na garganta e que me impede de gritar.
Eu escreveria sobre o imenso vazio de não pertencer a lugar nenhum, de não se enxergar em reflexo nenhum, de não saber se definir - como definir-se se a cada instante há uma reconfiguração de personalidade? Do ódio ao amor em questão de minutos, embaralhando o cérebro das pessoas que mais amamos, aquelas poucas corajosas que encaram entrar nessa montanha russa.
Muitas pessoas que encontrassem um papel assim na rua e por curiosidade (e paciência) lessem até o final, poderiam achar piada, frescura ou chilique alguém dizer que chega a ser uma dor física, uma angústia insuportável a possibilidade de qualquer tipo de rejeição e abandono, até aquele abandono que só a gente fantasia. Diriam que é pra chamar a atenção quando não aguentamos mais nossos fantasmas e só queremos morrer.
Mas danem-se.
Ainda há tantas pessoas sofrendo achando que não são normais, sendo julgadas por não conseguirem parar em um emprego, rotuladas de neuróticas (ok, somos)...
Seria mais fácil sair pichando muros escrevendo "Respira fundo. Você vai sobreviver." Mas isso não bastaria pra dizer que estou lutando também. E nem a muralha da China daria conta do que sentimos.
Eu me contentaria em espalhar textos aleatoriamente por aí. Se apenas uma pessoa passar, ler, entender um centésimo do que sentimos ou descobrir que o que sente não faz dela uma louca, mesmo que a vontade de morrer pareça maior que tudo (parece, mas nunca é) vai ter valido a pena dizer pra respirar fundo e sobreviver.